O que se vê na tevê

“Um posto de combustíveis às margens da rodovia”. Ouço frases assim e parecidas todos os dias, várias vezes, na tevê – e se escrevo “tevê” é porque está em qualquer canal, e não apenas na TV X ou na TV Y (essa sigla TV, só a uso antes de nome oficial; no genérico, prefiro a grafia de quatro letras). Ora: de que tamanho será esse posto para estar dos dois lados (margens) da rodovia, hem? Alguém precisa explicar que existe “margem”, singular, que se refere a um dos lados...

Margem, originalmente, se aplicava aos rios e queria dizer literalmente os dois lados do curso d’água. Dando-se as costas para a origem (montante), temos a margem direita à nossa direita e a margem esquerda à nossa esquerda, naturalmente; podemos nos referir aos pontos cardeais para especificar as duas margens das rodovias; ou o sentido do percurso: “À margem direita no sentido Goiânia-Anápolis” (por exemplo).

E o que gaguejam nossos coleguinhas? Estranhamente, os repórteres são mais desembaraçados, ainda que violando regrinhas básicas de concordância e regência: “Quando a família chegaram (sic) na (sic de novo) cidade...”. Ou ainda “A moça que ele gostava” (engoliu o “de” antes do “que”).

Mas deixemos em paz nossos coleguinhas desligados do léxico. Os pecados maiores ficam por conta de políticos. Nossa! O que ouvi num telejornal noturno acerca do péssimo estado de um Centro de Atendimento Integral à Saúde (CAIS) numa cidade da Região Metropolitana de Goiânia estarreceu-me! Primeiro, o prédio que já devia ter caído (sem qualquer providência por parte das autoridades, ainda que o secretário da Saúde local declare que dispunha de três milhões de reais desde o começo do ano para corrigir aquilo lá...) foi tomado literalmente por baratas. Milhares delas! Muitos milhares de baratas tontas, evidenciando que foram desalojadas de seus esconderijos por um forte inseticida que enojou e afastou de lá os usuários.

Que desrespeito ao usuário!

Em seguida, a apresentadora contou que o Ministério do Trabalho interditou o local por absoluta falta de condições gerais de trabalho. E então – pasmem! – aparece o prefeito a dizer, com todas as letras, que não acataria a determinação e que aquela decisão tinha “propósitos políticos”.

Para agravar, o prefeito acusa a autoridade federal de “desrespeitar” o direito das pessoas necessitadas de socorro de usufruírem daquela unidade de saúde. Ah, nem! – pensei eu, de modo goianíssimo – não acredito no que estou ouvindo! Quem é mesmo que desrespeita o usuário do CAIS? O órgão fiscalizador, que age rápido ao saber daquilo lá, ou o prefeito que, mais que sabedor do péssimo estado de uma repartição de sua estrutura, preferiu ignorá-lo? Cadê os três milhões de reais que o secretário nomeado por esse mesmo prefeito diz ter para resolver aquilo lá?

E essa gente, nas campanhas, vem com cinismo e pose de bom-moço pregar lisura e pedir votos!

Eu, hem?

Texto do escritor Acadêmico Luiz de Aquino publicado originalmente em:

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