Júlia tinha uma história de vida
bem marcante. Ainda era bem jovem quando se apiedou de um viúvo que
tinha um filho e resolveu ir morar com ele e cuidar da criança. Se não
me engano agora, acho que naquele tempo Júlia tinha 18 anos e o tal
viúvo, 40. Boa ação a sua, não tenham dúvidas, mas daí se tornar a
esposa de um homem de quem não gostava por se apiedar, é coisa de
adolescência tardia.
Mudou-se
de mala e cuia para a casa de Afonso, esse o nome do viúvo, e se apegou
bastante ao pequeno Leandro. Ocorre que o marido, chamemos assim, com o
correr do tempo, se transformou em um folgado. Trabalhava bastante,
disso não podemos reclamar, mas suas idas aos bares da vida se tornaram
cada vez mais frequentes.
Fato
é que Júlia, em pleno aniversário de 20 anos, ficou sozinha em casa e
com a mente cheia de conjecturas. Não tinha família, era órfã, e talvez
aí estivesse a base do apego seu à história daquele homem e seu filho.
Quando reclamou, ainda era o dia do seu aniversário, mas isto não
amenizou a surra que levou. Queria de pronto ir embora, mas Leandro
chorou, disse que ela era sua mãe verdadeira. No mais, Afonso se
arrependeu de verdade e prometeu não mais encostar a mão nela. De fato,
nunca mais lhe bateu. Mas também nem precisava porque gato escaldado...
Ela parou de reclamar.
No
resumo da história, Júlia passou a conviver unicamente com Leandro, já
que seu pai ficava até dias fora de casa. Que fazer? Como dar um nó
desta situação? Sua sorte mudou quando a avó materna de Leandro, que
morava em outro Estado, veio para visitar o neto e tomou ciência da
situação. Não teve dúvidas, conseguiu na justiça a guarda do meninno e o
levou embora. Afonso esperneou mais ainda porque tinha que pagar pensão
alimentícia estipulada por um juiz, e caso se tornasse inadimplente,
seria preso.
Na
terceira vez que o oficial de justiça veio buscá-lo porque estava
atrasado três meses de pensão, foi que Júlia decidiu deixá-lo de vez.
Mesmo depois que a criança se foi, ela continuava na casa com pena do
homem e sua solidão. Mas naquela manhã que o viu já dentro da viatura
policial, resolveu ter pena de si mesma. Deixou um bilhete curto que eu
resumiria em uma palavra: Adeus. Depois pegou roupas e outros pertences
pessoais, pouca coisa tinha de seu, e se foi para nunca mais voltar.
Parou
Júlia na praia quando o sol surgia no horizonte, tirou a roupa a saiu
cantarolante com os braços abertos, a mente livre. Sabia que agora era o
momento de recomeço. Pouca gente pode recomeçar. Júlia era uma
privilegiada.
Acadêmico Adriano Curado
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