Os óculos mais horríveis do mundo

Para as coisas positivas é relativamente simples achar uma classificação de valores. O mesmo não acontece para as negativas. Por isso é mais fácil eleger o sujeito mais forte de um país ou continente, mas é quase impossível apontar o mais fraco. É possível eleger o homem ou a mulher mais sexy do mundo, mas seria quase impossível, o mais pudico e sensaborão. Acredita-se na lista dos melhores filmes; mas a dos piores soa falso. Todo ano sai a lista das pessoas mais ricas da Terra, já dos mais paupérrimos ninguém ousaria fazer. Não só porque não despertaria interesses, mas porque contabilizar o nada e o nada menos alguma coisa é mesmo tarefa inglória. 




Mas eu tenho os óculos mais feios do mundo. Se não os mais feios, pelo menos os mais rejeitados: um micro Ray-ban retrô. Apresento fatos que me autorizam tal afirmativa. Sabe como é pobre, sobretudo se provinciano. Há doze anos estive na França. Depois de passar anos e anos juntando os caraminguás, eu e minha mulher estivemos na França por ocasião de nosso 25º aniversário de casamento. Foi um passeio bacana. Se tivesse condições a gente o faria mais vezes. Mas o propósito de falar do passeio é só para contextualizar meus óculos, que são os mais feios do mundo. 

Sabe como é pobre quando passeia. Principalmente se o passeio é no exterior. Apesar da escassez da grana, quer trazer presentinhos para Deus e o mundo. Nem que seja uma medalhinha ou um decalque de geladeira. Em Nice, na Riviera Francesa, comprei um par de óculos, na Chanel Boutique, para meu filho então adolescente. Como era de grife, de uma loja de grife, pensei estar abafando. Quanto equívoco! Meu filho não quis nem experimentar. Falou que era paia, fora de moda. A muito custo vestiu os óculos (ou seria calçou?) e olhou-se no espelho. Fez cara de descontente. Minha filha mais velha esculhambou o resto: bom de ir pra esquina pedir esmolas, como ceguinho!

Magoei. Os óculos ficaram por ali, jogados. Minha mulher ainda tentou convencer algum sobrinho mais distraído da beleza dos óculos e se quisesse poderia até ficar com eles. Ninguém se atreveu. Depois de alguns anos, passei a carregá-los no porta-luvas do carro e eventualmente faço uso deles, quando me encontro sozinho. Na vista dos outros seria pedir para ser zoado. 

Ano passado sofri um assalto. Me levaram o carro e objetos pessoais, inclusive os óculos, que já estão mais desbotados que flamingos de zoológico. Dias depois, a polícia achou o carro. Dos objetos, apenas o par de óculos estava lá, inabalável testemunha ocular do crime. Pensei: Bem, não foi desta vez que me livrei destes benditos. 

Agora recente fui assaltado de novo e lá se foi o carro com documentos e diversos objetos. Inclusive os malfadados óculos. Alguns dias se passaram e nada de o carro aparecer. Pensei: Agora os óculos se foram de vez. Ontem, alguém me ligou dizendo que encontrara uma carteira com documentos no meu nome. Negociei com ele a devolução e o local para entrega. Num ponto de ônibus. Por precaução, temendo cilada, levei um amigo. Mas, lá chegando, ele me entregou os documentos de boa e lhe paguei o valor combinado. Para minha surpresa, já saindo, ele enfiou a mão no bolso da bermuda e me falou com ar de deboche: Achei também este óculos. É seu?

Ao ver os óculos, meu amigo perguntou meio gaiato: Tem coragem de usar?

Edival Lourenço