Geralmente, na minha profissão de
advogado, não faço defesa de homens que batem em mulher porque acho esse
crime muito injusto. Mas eu havia terminado uma audiência e já me
preparava para sair do fórum, quando a secretária de audiências disse
que o juiz queria me ver. Retornei então e fui recebido pelo magistrado
que me pediu um grande favor. É que ele precisava realizar uma audiência
de réu preso e o detido, sem recursos financeiros para pagar um
defensor, precisava ser assistido por advogado. Era um caso que se
enquadrava na Lei Maria da Penha, de violência dentro do lar conjugal.
Titubeei um pouco, mas como o juiz queria se livrar logo do problema,
topei ajudá-lo desta vez.
Eu
ainda lia os autos do processo, quando entrou o espancador de mulher.
Fiquei surpreso porque o homem era franzino, muito magro e fino, tinha o
olhar bem assustado e apresentava hematomas pelo rosto. Troquei olhares
com o promotor de justiça e ele também se mostrava surpreso. Quando
começou a ser interrogado, o homem chorou e disse que era impossível ter
cometido aquele crime porque a mulher era bem mais forte que ele.
Confesso que senti vontade de rir, mas me contive porque me pareceu
sincero o depoimento daquele desesperado.
— Eu é que apanhei dela, doutor, e não foi pouca coisa. Estou com o corpo todo dolorido e ainda escuto um zumbido no ouvido.
Terminado
o interrogatório do réu, eis que entra na sala de audiências a
esposa/vítima. Era uma mulher enorme, forte, braços musculosos de
trabalhos braçais. Acho que dava duas vezes o tamanho do marido. Ela
confessou que realmente deu uns sopapos nele, mas foi merecido porque
ele resolveu falar alterado dentro de casa. Algum vizinho chamou a
polícia e os policiais, obviamente, não quiseram nem ouvir o coitado e
já o enquadraram logo na violência de gênero contra a mulher.
Achamos
mais sensato arquivar logo aquele processo. Não era necessário colher
provas e nem ouvir testemunhas. Neste caso, por absoluta impropriedade
do meio, trata-se de crime impossível de ser praticado. Depois de findos
os trabalhos, quando estávamos apenas eu, o juiz e o promotor na sala,
confesso que rimos tanto que até perdi o fôlego.
Adriano Curado
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